Google+ O Livro dos Deuses Nórdicos: A idealização guerreira: servas de Odin, condutoras para o paraíso

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23 de agosto de 2013

A idealização guerreira: servas de Odin, condutoras para o paraíso

Foi durante a Era Viking (799-1066 d.C) que o mito das valquírias foi amenizado, transformado em uma representação mais dignificada, heroica e nobre.
O poeta islandês Snorri Sturluson resgatou durante o período cristão (Edda em prosa, também denominada de Edda jovem, 1220 d.C) uma das imagens literária mais populares dessas criaturas para a mitologia dos tempos vikings: “Há ainda outras para auxiliar Valhöll, servir a bebida em volta, servir a mesa e os cornos de cerveja[...] Ódinn as envia para todas as batalhas, onde elas escolhem quem vai morrer, e as regras sobre a vitória” (STURLUSON, 1995).

Representação de uma valquíria segurando um corno


Um papel suplo. Ao mesmo tempo em que sçao guerreiras e escolhem o destino das batalhas, transportando os homens tombados nos conflitos para o Valhöll (Valhalla: “salão dos mortos” de Ódinn), neste mesmo local elas atuarão como serventes, semelhantes a taverneiras:
Estes seriam então espíritos dos mortos, privilegiados em certa medida, que se devem escolher congêneres. Elas traduziram assim, admiravelmente, as ideias centrais unidas a Ódinn, deus dos mortos, porque regulavam seu destino, quando bem mesmo o seu propósito escapava (BOYER, 1981, p.142)
Essa dupla imagem também aparece em outra importante fonte do período cristão, a Elder edda (Edda Antiga, também chamada de maior ou poética), uma compilação de poemas escandinavos escritos no fim do século X ou XIIII ( e reunidos em um único manuscrito, Codes regius, de 1300).

O mais antigo desses poemas, Völuspá (“a visão da profetisa”) composto em meados do ano 1000, possui uma estrutura nitidamente paganista. Nele, essas criaturas sobrenaturais são apresentadas como guerreiras portando escudos. Seis nomes são mencionados: gunnr (“batalha”), hildr (“batalha”), göndul (“que maneja a vareta mágica”), skögul (“batalha”) e geriskögul (“lobo de batalha”). Praticamente todos esses nomes estão relacionados com a guerra ou com características que relacionam as valquírias com conflitos armados. A associação entre a metamorfose do mito valquiriano na Era Viking com mulheres guerreiras reais é muito atraente para os analistas contemporâneos, apesar de ser uma questão ainda aberta a muitos debates.
Outro poema éddico, Grimnismál (“os ditos de Grímnir”) repete e apresenta outros; Hrist (“a abaladora”), Mist (“a bruma”), Skéggjöld (“desgaste com machado de batalha”), Prúrd (“força”), Hlökk (“barulho”), Herfjötur (“paralisia”), Göll (“lágrimas de batalha”), Geirólul Randgrídr (“escudo da paz”), Rádgridr (“paz dos deuses”), Reginleif (“patrimônio dos deuses”). O interessante é que apesar do sentido dessas denominações, as valquírias são apresentadas como servidoras do deus Ódinn e dos einherjar (singular: einheri, “guerreiro que combate sozinho”), os campeões mortos em batalhas. Esse poema deve ter sido elaborado entre os séculos X e XI, visto que Snorri Sturluson baseou sua literária no mesmo texto.
Poucas representações iconográficas sobreviventes da Era Viking apresentam as valquírias portando armas, capacetes, lanças, espadas, cotas de malha ou andando a cavalo. Em quase todos os pingentes e esculturas/pinturas em estelas elas surgem como damas portando longos vestidos, cabelos bem arrumados e, na maior parte das vezes, transportando um corno com bebidas. Do mesmo modo, as representações visuais de donzelas-cisne foram omitidas, com exceção de um objeto em que uma figura feminina lembra um pássaro. Apenas restaram imagens das valquirias como serventes do Valhöll?


Dentre essas fontes iconográficas, as mais importantes são as estelas funerárias da ilha de Gotland (Suécia), Além de possuírem um caráter religioso, eram executadas para glorificar os feitos do morto e serviam em um primeiro momento como reforço para os cultos solares, dos mortos dos rituais odinistas. Também funcionaram como instrumentos pedagógicos visuais, mantendo a legitimação do poder politico da classe aristocrática e da realeza, as principais estruturadoras do odinismo da Escandinávia medieval. Com isso, as estelas só representaram uma faceta do mito. Em uma sociedade dominada por uma visão totalmente masculina, a representação da jornada de um guerreiro do mundo dos vivos para o mundo dos mortos não podia ser questionada ou abalada. Caso uma valquíria fosse representada portando armas e montando cavalos (a exemplo dos guerreiros das estelas), ela seria um elemento contra a ordem de legitimação dos triunfos da realeza e dos heróis. Assim, sua imagem como serviçal reforça as representações de uma grande recompensa para uma vida marcial masculina, além de manter a ordem odinista.

Adaptação do livro: Deuses, Monstros, Heróis (Jhonni Langer)

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