Google+ O Livro dos Deuses Nórdicos: As valquírias como transgressoras: as narrativas de Brynhyldr

Páginas

11 de setembro de 2013

As valquírias como transgressoras: as narrativas de Brynhyldr

Imortalizadas pelas óperas de Wagner, Brynhyldr tornou-se a partir do século XIX a mais famosa valquíria de todos os tempos. Os últimos poemas da Edda poética narram algumas de suas façanhas (com o nome de Sifdrifa, “nevasca de batalha”), bem como a Völsunga Saga.

No desfecho do poema éddico Fáfnismál (“os ditos de Fáfnir”), o herói Sigurdr (“favorecido pela batalha”), após matas o dragão Fáfnir e comer seu coração, consegue entender a linguagem dos pássaros da floresta. Estes comentam a respeito de uma sala existente na montanha Hindarfial, que seria cercada por fogo e ali dormiria uma valquíria. Ela estaria recebendo um castigo por não ter agido do modo que Odin queria.

A narrativa prossegue no poema Sigrdrifumál (“os ditos de Sigrdrífa”). Chegando nesta montanha, Sigurdr contempla uma mulher dormindo, totalmente vestida com equipamentos de guerra: cotas de malha e elmo na cabeça. Utilizando sua espada mágica (Gramr), o herói rompe a malha do corpo, despertando a valquíria. Ela conta que se chama Sigrdifa e as razões de ter sido encantada: fez morrer um rei cuja vitória em batalha havia sido prometida pelo deus Odin. Além do encantamento, deveria contrair matrimônio com um homem que não tivesse nenhum temor. Em seguida, ela descreve a sabedoria das runas, suas utilizações para a magia e para elaborar encantamentos.



Sigurdr contemplando Brynhyldr



Esse caráter de grande sabedoria da valquíria é reforçado na Völsunga Saga. Após beber e ensinar Sigurdr os segredos das runas, Brynhyldr (“armadura de batalha”) profere vários conselhos sobre o convívio, comportamento, enfim, regras sociais muito semelhantes às existentes no poema éddico Hávamál, todas de cunho odinista. Apesar de ambos jurarem fidelidade, posteriormente Sigurdr acaba casando-se com Gudrún, filha do rei Gjúki. Também auxiliou Gunnar (irmão de Gudrún) a conquistar o direito de casamento de Brynhyldr, por meio de uma metamorfose mágica ( Sigurdr se faz passar por Gunnar, penetrando a muralha de fogo do palácio).Tempos depois a valquíria descobre toda a trama e instiga o assassinato de Sigurdr. Arrependida e em desespero, suicida-se junto à pira funerária do herói.

Brynhyldr arrependida antes de cometer suicídio

A partir disso podemos perceber a atitude de Brynhyldr, desobedecendo o deus Odin, como uma tentativa de mulher de se equiparar ao homem. Sendo uma valquíria, ela é um ser incomum. O fogo é um símbolo odinista, bem como o segredo das runas. Ao penetrar o circulo de fogo e principalmente ao retirar com sua espada a cota de malha da guerreira, o herói Sigurdr encarna o protótipo do ideal masculino: controlar a mulher e submetê-la ao domínio do lar. Essa dualidade da situação feminina pode ser percebida em uma passagem da Völsunga Saga, em que Bekkhildr foi descrita como típica mulher dedicada ao lar ,enquanto sua irmã Brynhyldr saía sempre de casa para lutar, vestida com cota de malha e elmo. A punição das valquírias é o casamento. É com essa prática que ela deixa de ser desafiadora do mundo masculino e se torna dominada, Em outra passagem da Völsunga isso também é claro, quando Brynhyldr prediz o futuro para Sigurdr, afirmando que os dois não ficarão juntos e ela continuará a guerrear.

Nas outras narrativas que analisamos anteriormente, também verificamos que as donzelas-cisnes foram capturadas e tornaram-se simples mulheres com união matrimonial: “casar-se com um homem é, para uma valquíria, pura punição inflingida por Odin”. Tornando-se apenas reprodutoras da prole real, elas deixam de ser uma ameaça ao ideal guerreiro:

[...]quando as valquírias consentem em ter um filho, perdem ipso facto seu status e tornam-se simples mulheres, se assim se pode dizer. Sevas dos guerreiros-escolhidos do Válala e mães de príncipes. Como se houvesse incompatibilidade entre a mulher-cisne intocável ou a virgem com o elmo na cabeça, e a senhora da cerveja (Ölrun). (BOYER, 1997, p. 746)

Também em descrições históricas de mulheres guerreiras, como famosa Hervor, percebemos que elas perdem essas características marciais com o casamento”

Adaptação do livro: Deuses, Monstros, Heróis (Jhonni Langer)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...