Google+ O Livro dos Deuses Nórdicos: A idealização de proteção: as valquírias como agentes do destino heroico

Páginas

10 de setembro de 2013

A idealização de proteção: as valquírias como agentes do destino heroico

Seguindo a sequencia tradicional da Edda maior, encontramos três poemas relacionados ao herói Helgi. A primeira história (Helgakvida Hjörvardssonar, “a balada de Helgi, o filho de Hjörvard”, século XIII) relata a trajetória do filho do rei Hjörvard e Sirgrlin, um rapaz de grande tamanho mas sem fala e sem nome. No momento em que se encontrava pastoreando, o jovem príncipe avisa um grupo de nove valquírias. A mais formosa dessas mulheres se aproxima e denomina o príncipe de Helgi (“sagrado”), além de presentaá-lo com uma espada com guarda-mão em forma de dragão. Com auxilio dessa arma mágica, Helgi venceu vários obstáculos, entre os quais matou um gigante chamado Hari. Seguindo a narrativa, Helgi torna-se um grande líder e guerreiro, casando com Sváva, também filha de rei, que lhe havia presenteado com uma espada. No momento em que seu marido participava de batalhas, Sváva retornava à sua condição de valquíria. Ao mesmo tempo em que serve como agente sobrenatural em toda a trama, Sváva protege o destino do herói – seja ao conferir – o nome, como assistindo aos seus feitos de guerreiro. Na região de Sigarsvéllir, Helgi é ferido mortalmente, falecendo em seguida.
O segundo poema, Helgakvida Hundingdbana II (“a balada de Helgi, o matador de Hundingr”), narra que os dois personagens renasceram, Helgi como filho do rei Smundr e Sváva como Sigrún (“runa da vitória”), filha do rei Hogni (e do mesmo modo uma valquíria). Além de continuar sendo amantes, Sigrún conserva seu ímpeto de proteger o amado. No momento em que Helgi reuniu uma grande esquadra para se dirigir à região de Frekastéin, uma enorme tempestade ameaça a esquadra. Nove valquírias (entre as quais Sigrún) surgem voando e salvam a expedição. Também em outro poema éddico contando a narrativa de Helgi como filho de Sigmurd, as donzelas de Odin protegem o rei no momento de uma perigosa travessia marítima e no transcurso de uma batalha. Continuando a narrativa, Helgi é morto por seu cunhado. Este ultimo, chamado Dag, havia planejado vingar-se do herói pela morte de seu pai, e com o auxilio da lança Gungnir (entregue pelo próprio deus Odin) atinge Helgi mortalmente. Chegando em Valhalla, Helgi tornou-se o chefe dos einhejar. Algum tempo depois, ao visitar o túmulo do amado, Gúndur consegue contatá-lo e saber do seu destino como intermediaroio odínico. Viveu mais alguns anos, antes de morrer e reencarnar como outra valquíria de nome Kára (“cabeleira crespa”). O herói renasce como Helgi Haddingiaskati.
Nas três narrativas éddicas, sobre esse herói (Helgi), percebemos a importância da figura das valquírias como intermediarias entre a realeza, o sobrenatural odínico e o destino do guerreiro no mundo dos mortais.

Na realidade, o próprio personagem é a metáfora dos guerreiros pertencentes à aristocracia (jarls) e à realeza (konunga-kyn) : “Helgi deve encarnar a noção de inviolabilidade unida ao solo, à femilia imemorável e aos grandes antepassados, por consequência. Também está relacionado com a noção de direito consagrada no Norte” (BOYER, 1997, p.79).




Em vez de simples serviçais ou donzelas-cisnes que se transformam em esposas (como vimos nos poemos éddicos anteriores), na tríade de Helgi essas criaturas míticas são representadas em uma forma muito mais doméstica, mas nem por isso menos protetoras : a personagem Sigrún/Sváva nomeia o herói; presenteia-o com um objeto mágico para que ele consiga efetuar sua jornada; assiste-o nas batalhas: salva-o dos momentos de perigo; torna-se esposa e concebe filhos para ele; realiza os ritos funerários; renasce como companheira e amante. Na realidade, ela torna-se uma esposa extremamente atuante na vida do herói, a ponto de renascer várias vezes e amá-lo novamente, sem necessariamente transgredir nenhuma ordem social. Voltava a ser valquíria somente quando o marido estava longe de casa.

Lado a lado com esse aspecto protetor, temos a ideia de que o herói ( que depois se transforma em rei) só conseguiria completar sua jornada épica em razão dessa interferência sobrenatural. As agentes odínicas elegiam seu protegido. Do mesmo modo, podemos perceber essa mesma ideia no poema funerário em louvor ao rei Hakon Haraldsson (Hákonarmál):

O rei escutou a fala das valquírias,

Homem nobre, montado em seu cavalo de batalha;

Elas reúnem-se com seus capacetes, em profunda reflexão,

Segurando seus escudos diante delas (HÁKONAMÁL)

Somente os reis podem governar, porque apenas eles seriam os eleitos pelas valquírias, intermediárias diretas do mais poderoso deus do panteão germânico. A melhor forma de reconhecer a autoridade de uma liderança política é identificar os elementos simbólicos e sagrados que autorizem uma classe a perpetuar seus membros no poder. No poema de Hákor, assim como na história de Helgi e em outras narrativas escandinavas, o rei apenas cumpriu papel sagrado de governar sua comunidade, com um destino previamente estabelecido: o de ser escolhido e protegido pelas guerreiras de Odin.

Diferentemente dos cultos á fertilidade (dos deuses vanes, celebratórios da vida no campo) – com os quais rivalizavam e disputavam espeço social e religioso-, os cultos odínicos celebravam a guerra, a morte e acima de tudo, a autoridade da figura do rei e a legitimidade do poder da classe aristocrática.





Adaptação do livro: Deuses, Monstros, Heróis (Jhonni Langer)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...